O rei leão estava gordo, pachorrento, acomodado, mas orgulhava-se nas rodas palacianas de ter promovido a modernização do reino.
Aparentemente havia o reconhecimento público de que a modernidade chegara à selva, com a informatização e a mídia eletrônica.
Havia sempre alguém do governo falando na televisão sobre planos e realizações governamentais.
Porque falavam muito, os governantes não escutavam o povo.
No início do ano, como era de hábito, o monarca compareceu à formatura dos bacharéis pela faculdade estatal.
O leopardo, ministro das Finanças e paraninfo, falou sobre as maravilhas do planejamento para o próximo exercício.
Em seguida, foi dada a palavra ao javali, representante dos graduados.
Sua fala estava estranha, destoando do habitual. Discorria sobre insatisfação popular, falava de excluídos, de má distribuição de renda e de poder discricionário para, no final, fazer uma indagação fulminante, mas compreensível aos ouvidos do soberano:
- Como está, em tudo isso a felicidade? Nosso povo é feliz?
E repetia enfático:
- Já pensaram seriamente nisso? O que está sendo feito de nossas vidas? Somos felizes?
Segue-se um silêncio sepulcral. O rei leão não sabia ao certo se aquilo significava rebeldia, como crítica ao seu governo.
Os ministros presentes murmuravam, inquietos. O desconforto era grande, até que alguém rompeu a inércia com palmas. Estas rapidamente transformaram-se em ovação generalizada e em uma nova bandeira...
O rei e o ministério, amargando a derrota, saíram apressados.
Naquele momento, a felicidade destronou o rei leão...
Do livro: Visão e Parábolas
Francisco Gomes de Matos
Editora Campus